sexta-feira, 20 de março de 2015

Acerca do papel do Pai

 “Ora, o pai – um pai de verdade – nunca será terceiro. Nem é ausente”
Escrito por Eduardo Sá Domingo, 17 Março 2013 |,  in PAIS e FILHOS

“Um pai de verdade nunca será terceiro. Nem é ausente. É precioso nos mais pequenos gestos. É firme e sereno. É sóbrio. É justo e arrojado. Terno e bondoso. E nem mesmo quando se afasta fica  ausente.
1 - Ao longo da história, as famílias foram sendo machistas e matriarcais. A mãe seria, formalmente, o número dois da hierarquia familiar, embora fosse o elemento preponderante na educação dos filhos. O pai respondia pelos recursos económicos e pela lei da família, embora fosse um número um, realmente ausente nos momentos preponderantes da vida das crianças. Em rigor, as crianças tinham dois pais mas nunca usufruíam de ambos em simultâneo e por inteiro. Apesar disso, o pai sempre se acomodou a essa função de elemento de segunda necessidade para o desenvolvimento das crianças: às vezes, porque era colocado, pela mãe, longe da relação com os filhos; às vezes, porque se excluía dela, tornando-se ausente.
O século XX transformou, profundamente, o lugar do pai. As crianças foram morrendo menos no primeiro ano de vida e, por isso, as gravidezes diminuíram. Os métodos contraceptivos tornaram-se mais eficazes As mães passaram a ter uma vida profissional e muitos pais passaram a reclamar mais vida familiar.
2 - O pai é importante para o crescimento das crianças? É. E se muitas mulheres incentivam a «maternalização» do pai (repartindo com ele a educação dos filhos), outras continuam a exigir para si um protagonismo exclusivo que o coloca, invariavelmente, como terceiro na relação mãe/filho.
Ora, o pai – um pai de verdade – nunca será terceiro. Nem é ausente. É precioso nos mais pequenos gestos. É firme e sereno. É sóbrio. É justo e arrojado. Terno, empreendedor e bondoso. E nem mesmo quando se afasta fica ausente. É pai. Para sempre.
3 - Mas há pais que se ausentam e, com isso, magoam um filho. Haverá – de forma simplista – três formas de um pai se tornar ausente para os seus filhos: quando morre, logo que se demite e sempre que se afasta.
Há pais que morrem em vida, devagarinho. Serão, entre todos, os mais dolorosamente ausentes. Acompanham a vida dos filhos, desde sempre. Mas desconhecem-nos. Demitem-se de lhes ler o coração ou de se colocar, por instantes que seja, no lugar deles. Imaginam valer pelos bens que transmitem e nunca pelos sonhos que conquistam (esquecendo que os pais mostram um caminho sempre que o percorrem, nunca se o indicam). Mas morrem um bocadinho se não abraçam. Morrem quando não brincam. Morrem sempre que decepcionam. E são tantas as decepções que os seus gestos acumulam que, quando morrem de facto, os filhos atestam um óbito (mais que desmoronam num choque). E, ao morrerem, deixam a pior de todas as saudades: a saudade pelo que não se viveu. Não são pais pelos gestos que dão mas por tudo o que os filhos desejavam que dessem.
4 - Outros pais tornam-se ausentes quando se separam. Ao contrário do que se diz, não são, por isso, piores pais (embora alguns destes só despertem para os seus deveres de pais com o divórcio). E, se bem que muitos sejam, escandalosamente, descriminados pelo género sexual, quando se trata da atribuição do poder paternal dos seus filhos, muitos divórcios são amigos doutros pais: atribuem-lhe os filhos pelo tempo que, de modo próprio, nunca reivindicariam (tornando-os mais presentes, por dentro, depois de se tornarem, realmente, ausentes, por fora).
O grande problema dos pais de fim-de-semana é que se sentem tão pouco pais que imaginam valer mais pela benevolência de Pai Natal do que por eles próprios. Daí que desde o circuito das pizzarias, nos centros comerciais, até à forma como competem pelo amor dos filhos, em troca de uma t-shrt ou de outros ténis, tudo vale. E, pior, sempre que não são telepais, o exíguo espaço de tempo que compartilham com os filhos, empurra-os para a função de amigos mais velhos, mais ou menos demissionários (quando se trata de definir regras ou limites) que é tudo o que um pai não deve ser.
Alguns destes pais tornam-se ausentes por fora e por dentro. A sua ausência parece legitimá-los nas omissões em relação a momentos fundamentais da vida dos filhos. Falham nas alturas em que a sua presença seria imprescindível. Exigem e intimidam, como se todos os direitos que reclamam não se devessem iniciar em idênticos deveres. Na verdade, não são pais. São, simplesmente, progenitores.
5 - Ora, o pai – um pai de verdade – nunca será terceiro. Não é ausente. Nem amigo ou progenitor. É precioso nos mais pequenos gestos. É firme e sereno. É sóbrio. É justo e arrojado. Terno, empreendedor e bondoso. E nem mesmo quando se afasta fica ausente. É pai. Para sempre.”
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